sábado, 23 de agosto de 2008

do hoje

Hoje tudo me parece déjà vu. Todas as minhas frases já foram proferidas. Meus insights são os mesmos do ano passado. Minhas angústias do anterior. Minhas espinhas da adolescência.

Escrevendo dois e-mails tive certeza de estar escrevendo as mesmas coisas para as mesmas pessoas, com alguns meses de diferença. Cheguei a conferir. Segundo o Gmail, foi só impressão. Dei alguns conselhos bebendo cerveja. Nada de novo. Engraçado. Quando vem essa sensação de repetição, eu não me sinto mais eu. É como se eu estivesse representando a mim mesma, numa versão anterior. E, se é assim, onde estou eu agora? Pra onde fui? Será que eu não mudei nada nesse tempo? Será que o tempo não passou, não passa, é só ilusão? E o perigo que é quando me surge a palavra "ilusão". Eu duvido um pouco de mim. Do mundo. Da realidade. Se torna mais palpável a ficção. E eu me sinto a um passo de me perder.

Talvez por isso a arte. Pelo sentido e as respostas que eu encontro, ou pareço encontrar, nela. Talvez por isso não a filosofia. Pelo medo das dúvidas que se juntam às minhas.

Talvez por isso as frases feitas. A pseudo grandiloqüência. Outro dia eu disse "Saudades, atrasadas e adiantadas", pra uma pessoa muito mais que querida, que eu não via há tempos e que ficaria indefinidamente sem ver. E estava sendo sincera. Mas vejo agora que fiz um recorte da realidade ali, assim como fiz aqui. Falando com um grande amor, são palavras tão vazias. Tão pequenas. E o verbo "ver" é uma parcela tão ínfima do que eu sinto.

E hoje eu sinto todo dia a mesma coisa, como há muito não me acontecia.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

poeminhas das 7

Leva essa lembrança tua
Essa memória nua
Esse dia de sol

Pega a minha felicidade
E toda a minha saudade
Do que passou lá

Quebra o meu coração
Que arrancou do peito
Sem piedade ou dó

Rasga logo a minha roupa
Que eu já estou louca
Que já não caibo em mim

Leva toda a minha justiça
Pois mesmo sofrendo
Sei que hoje sou ré

Que você deu no pé
E me deixou aqui
Pra proteger a si

Mas o que eu posso fazer...
Se tudo que eu sei fazer...
É te amar sempre em fá.

você é...

Ouvi algumas vezes que você é o que você lê. Não sei de onde tiraram isso. Já li alguns Gabriel Garcia Márquez, e ainda não sei usar a meu favor a constatação de que realidade e fantasia se misturam, fazendo com que nenhum seja absoluto. Ainda não sei diferenciar sentimentalismo de emoção. Ainda não aprendi a observar Macondo, as pessoas, suas relações, sem ser um narrador onipresente que julga ser possível descrever intenções, pensamentos, interesses, caráter.

Já li muito Fernando Pessoa. E não consigo ser ninguém além de mim. Continuo tentando fazer tudo caber dentro de um único frasquinho escrito EU. E lá não cabem as diferenças, incongruências, incoerências. Tenho sempre que jogar alguma coisa fora, algum pedaço de mim. E costuma ser o pedaço mais triste. Mais desajeitado. Aquele com o qual se aprende.

Li mitologia grega. E ainda me deixo abater pela tragédia, pela família, pelos erros que não são meus. De Shakespeare admiro, mas não incorporei, a demonstração de que não há verdade. Não há mentira. E que fazemos sempre uso de máscaras e disfarces, e podemos ter consciência disso.

Estou lendo Nietzsche. E não sei se consigo me despir, um pouco que seja, da moral. Do bem e do mal, da verdade e da certeza, da “sedução das palavras”.

Mesmo de um dos últimos livros que li, e que mais gostei, não conseguir transpôr para a prática o fato de que não há "fatos", e mesmo memórias não passam de invencionices. Lindas ficções, desde que não sejamos escravos dela.

Então, sejamos livros. Desde que sejamos livres.